4 maneiras incríveis de economizar língua sobre água de reúso
Voltando do supermercado, alheio a assuntos mais graves e pandêmicos, não é que me deparo com este dito de uma placa afixada no portão de um condomínio residencial: UTILIZAMOS ÁGUA DE REUSO.
Imediatamente, quatro personas mui distintas se debateram em mim. E por “personas” já me perdoe o latim.
A primeira delas, revisora, quis ir até a placa e apenas meter acento à palavra: “reúso”, porque hiato com u tônico (e mesmo o corretor do Word insiste em ceifar o acento agudo e coitado).
A segunda persona, mais voraz e concisa porque preparadora de texto, incomodou-se com a reverberação de termos tão primos, ainda que de classes distintas: por que “utilizamos” e “reúso”, se é possível enxugá-los em Reutilizamos água, assim clara, límpida e economicamente?
A terceira persona, tradutora sempre muito ciosa, teve a largueza de espírito que acolheu a redundância, justificando-a: “água de reúso” equivale a “reclaimed water”, e é a expressão assim contida que mesmo a Sabesp emprega. Então por que desconstruí-la, ainda sob a pena de não dizer o mesmíssimo e atrapalhar o possível SEO? Que fique a placa como está, acatado o acento do revisor.
Por fim, a quarta persona enfiou-se ali do nada com sua gravatinha-borboleta e vociferou contra os puristas da língua, enxergando na placa potencial publicitário de alcance infinito e mesmo poético:
POR ESTES CANOS CORRE ÁGUA DE REÚSO.
A persona publicitária amansou as três anteriores, que se deram em paz com a criatividade a canalizar questões vernáculas – ou porque, no fundo, nunca compreendem muito bem por que cargas-d’água a Publicidade se mete com as Letras.
Tolinhas.